Achado Precioso!
Com cerca de 600 brechós, 400 deles abertos entre 2019 e 2022, Belo Horizonte descobre que comercializar roupas e acessórios carregados de história é um bom negócio
Situado dentro de uma charmosa galeria na avenida Brasil, o Arca Brechó (@arca_brecho) traz em seu nome um simbolismo importante. Esse objeto, a arca, remete a um móvel no qual se guardam coisas únicas, preciosas, importantes. O nome se relaciona muito com o trabalho da proprietária Izabel Marques, que abriu o espaço no ano passado, e por lá oferece peças únicas e exclusivas que garimpa em feiras, bazares de igrejas e casas de pessoas.
“Costumo brincar que é um trabalho parecido com a arqueologia, pois encontro tecidos e modelagens que já não se encontram mais. Quem consome peças de brechó está interessado na exclusividade e na qualidade do material. Também acaba sendo um contraponto ao consumismo desenfreado que vivemos hoje. Comprar peças de segunda mão é muito mais sustentável”, analisa.
Formada em moda, ela também costuma agregar seu conhecimento na hora de atender a clientela. “O objetivo não é vender de maneira exacerbada, é realmente ajudar o cliente a encontrar a peça que vai valorizar seu corpo e estilo. Também dou dicas de como a pessoa pode lavar e passar aquela peça para aumentar a sua durabilidade”, diz.
O negócio de Izabel faz parte de um movimento crescente de consumo que se baseia em sustentabilidade e valorização de roupas e acessórios que já têm uma história. De acordo com um levantamento divulgado recentemente pelo Sebrae, Belo Horizonte conta atualmente com cerca de 600 brechós, sendo que a maioria deles, cerca de 400, foram abertos entre 2019 e 2022. Em Minas Gerais, são cerca 3 mil espalhados pelo estado.
Veterano nesse cenário, Getúlio Amaral trabalha no ramo há duas décadas e comanda o Idée (@ideeloja) há 11 anos. Apaixonado por peças com modelagens e texturas diferenciadas, é comum a clientela encontrar roupas e acessórios de grandes marcas internacionais – como Balmain, Gucci e Versace. “Algumas eu só faço aluguel para editoriais de moda ou produções audiovisuais, por uma questão de preservação”, conta.
Para ele, tem sido uma grata surpresa todo esse crescimento pelo qual o setor tem passado nos últimos anos. “Quando comecei no mercado de brechós era algo muito restrito, quase underground. O que enxergo de mais positivo é a divulgação, quanto mais pessoas consomem mais o setor ganha valor e isso é positivo para todos que trabalham com peças de segunda mão”, aponta.
Para Gabriela Penna, professora do curso de moda do Centro Universitário UNA, a preocupação com o planeta é um dos ingredientes que fez esse bolo crescer. “Já tem um tempo que as pessoas vêm se questionando sobre o impacto do mercado da moda na natureza e a origem dos produtos. Consumir é um ato político e, se você deseja diminuir o impacto daquilo que você compra, faz sentido dar prioridade a uma peça que já existe”, diz.
A paixão pela nostalgia também faz com que as pessoas frequentem mais os brechós em busca dos “tesouros perdidos das últimas décadas”. “A cantora Dua Lipa fez um álbum homenageando a era disco e a série Stranger Things prova que a década de 1980 é super cool. Hoje em dia é possível usar peças antigas sem ficar algo caricato e, obviamente, os brechós se beneficiam disso”, afirma.
Por fim, ela também aponta para uma profissionalização cada vez maior do setor e que as lojas têm se posicionado como marcas preocupadas com curadoria. “Brechó deixou de ser um local para comprar roupa barata e tornou-se um espaço em que o olhar do dono influencia muito na seleção das peças. Quem frequenta um brechó sabe que vai encontrar uma roupa ou acessório repleto de história, especialmente selecionado e isso agrega muito valor”, destaca.
Essa ideia também é defendida por Amanda Mendes, que abriu o Dorotea Brechó (@doroteabrecho) em 2012. Segundo ela, um dos desafios enfrentados pelos brechozeiros é o preconceito em relação à origem das peças e os valores cobrados. “Algumas pessoas, felizmente a minoria, ainda nos questiona se a roupa é de gente morta ou reclama que é caro. Faço questão de explicar que temos todo um processo de compra, higienização, reparo e preparação para que aquela peça chegue na loja de uma forma bacana para o cliente. É justo recebermos por isso”, diz.
E, além das lojas, o negócio dos brechós também prova que é funcional em outros espaços. Thiago Flores, dono do Camaleoa Brechó (@camaleoabrecho), já teve seu espaço comercial no bairro Floresta e teve que fechá-lo por conta da pandemia. Desde então, vende as peças pelo seu e-commerce e atende com hora marcada na sala de sua casa. “Eu monto uma arara de acordo com o gosto do cliente e o atendimento é extremamente personalizado”, explica.
Outro destaque de seu trabalho é a quebra de gêneros e o fato de que qualquer peça pode ser comprada por homens e mulheres. Ele próprio faz fotos usando vestidos e outras peças ditas “femininas” para divulgar nas redes sociais do Camaleoa. “Para mim sempre foi um processo muito natural. O brechó é bem mais flexível e nos permite escolher o que nos cai melhor. Já aconteceu de um homem vestir uma camisa feminina, gostar do resultado no corpo e acabar levando”, conta.