Gestão

A força do coletivo

VB ED279 Maio 24 capa a forca do coletivo

imagens de mineração 

Fonte:flickr.com

 

 CEO da Anglo American e presidente do Ibram fala sobre a essencialidade da mineração, a comunicação com a sociedade e a necessidade de uma operação responsável e sustentável

 

               Um dos principais setores da economia brasileira, a mineração é responsável por mais de 16% do Produto Interno Bruto (PIB) industrial do país, pela geração de pelo menos 190 mil empregos, e está presente no dia a dia das pessoas em vários produtos, da geladeira ao automóvel. Mostrar essa importância do setor no dia a dia das pessoas não tem sido uma tarefa fácil. Essa responsabilidade está agora, nas mãos de Ana Sanches, a CEO da Anglo American, que assumiu a presidência do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). Uma mulher conduzindo a discussão de um setor dominado por homens. Ou melhor, que era dominado por homens.

 

VB ED279 Maio 24 a forca do coletivo
Ana Sanches:CEO da Anglo American e presidente do Ibram

              

A mineração é um universo masculino? é preciso se impor para tomar algumas decisões?

              É interessante porque eu comecei a minha carreira aos 21 anos, numa empresa de consultoria e auditoria, a Arthur Andersen. Era um ambiente muito masculino. Entravam todo ano os trainees, até um número grande de mulheres. Mas, à medida que íamos crescendo na carreira, as mulheres iam embora e os homens é que permaneciam. Fui criada nesse ambiente ali, fiquei muitos anos, depois fui para uma outra indústria, também muito masculina, a indústria do cimento. Até vir para a indústria da mineração. Eu estou aqui desde 2012, então eu tenho 27 anos de carreira em ambientes substancialmente masculinos.

               É interessante porque a gente não falava disso antes. Não conversávamos sobre a inclusão, a diversidade. Eu não tinha tantas mulheres líderes com quem eu pudesse conversar, trocar ideia, escutar. Se alguém me perguntasse, até pouco tempo, “Ana, você sofreu muito preconceito?”, eu ia falar que não, porque eu não via. Eu não estava enxergando e as coisas estavam acontecendo. Seja por falta mesmo até de conhecimento ou porque não estava alerta. E era um ambiente sempre muito competitivo, principalmente no meu início de carreira.

               Mas a minha competição é comigo mesmo, eu queria ser a Ana melhor hoje do que eu era ontem. Isso me motiva. E quando eu escutava alguns comentários que hoje eu entendo que são machistas, ou que estavam ali para me diminuir, de alguma forma, aquilo me servia como munição, porque eu queria fazer melhor, eu queria ser melhor. Mas hoje, com a pessoa que eu sou, com o nível de conhecimento, eu olho para trás e vejo que sofri, sim, preconceitos. E eu não quero que outras mulheres passem por isso porque eu não quero que isto as faça desistir. E eu me sinto muito no papel de ajudá-las. E ajudar os homens nessa conscientização, de que não basta dizer “é bacana, eu apoio”. Tem que agir e agir de forma intencional. Tiveram, sim, pedras no meu caminho e, de alguma forma, elas acabaram me ajudando a me fortalecer. Mas nem todo mundo passa pelas mesmas histórias. Eu estou aqui para ajudar quem está com uma história diferente.

 

Além da Anglo American, você também é presidente do ibram, que tem uma pauta complicada com o governo federal. como tem sido essa relação com os empresários do setor e com o governo?

               Eu sinto que o setor de mineração no Brasil acordou para a força do coletivo e com a vontade cada vez maior de fazer essa transformação de forma conjunta. Um setor que entendeu que, às vezes sozinho a gente vai mais rápido, mas juntos nós podemos ir mais longe. É um setor que, quando olhamos para a sociedade, percebemos o tanto que a sociedade ainda desconhece sobre o que é a mineração. Sobre a essencialidade da mineração, quando a gente olha ao nosso redor, praticamente tudo o que vemos, de uma forma de outra, tem vínculo com a mineração. É uma sociedade que não conhece o que acontece por trás das montanhas e que nem sempre acredita que é possível, sim, fazer uma operação sustentável e responsável.

            E onde é que nós falhamos, como setor, por não dar essa clareza para a sociedade? Por não ajudar a sociedade nesse movimento de conscientização e educação. Então, o setor de mineração no Brasil está cada vez mais entendendo isso e querendo agora trabalhar de forma conjunta para contar para a sociedade o que fazemos, como a mineração é importante e como a gente pode fazer, sim, de forma responsável e sustentável. Então é um setor que está querendo dar mais as caras. Está querendo ser mais visível e está querendo, o que para mim é mais importante, escutar mais.

Houve uma demonização do setor depois das tragédias em mariana e brumadinho?

               Eu acho que tivemos esses eventos que marcaram a nossa história, mas que dão toda oportunidade para um recomeço. Toda oportunidade para aprendermos, para fazermos cada vez melhor. É a oportunidade para escutarmos e trazer as pessoas para cada vez mais próximas. Acredito, verdadeiramente, que isso é possível. Mas acho que temos que saber contar mais para a sociedade sobre a nossa atuação. Qual o processo produtivo da mineração. quais são os seus resultados e como são usados E mostrar com fatos e dados como contribuímos para as comunidades anfitriãs. Como podemos ter o nosso papel ali no crescimento dessas comunidades, no enriquecimento, no desenvolvimento. E como podemos sim, fazer toda a diferença de forma muito positiva para quem está ao nosso redor.

Há um distanciamento com a sociedade?

             Eu acho que a mineração está muito próxima das comunidades. Então não tem por que ter distanciamento. Fazemos parte, estamos inseridos ali naquela comunidade, empregamos tantas pessoas da região, tantas famílias, que têm ali, de uma forma direta ou indireta, os benefícios que a atividade econômica da mineração pode trazer para aquele local. Tem é que ter escuta. E escuta humilde. Eu acho que tem que ter oportunidade de troca, porque escuta é dar oportunidade às pessoas para elas se expressarem e, também, de sermos muito transparentes e de uma forma muito positiva. Na Anglo American, nas regiões onde atuamos, seja no estado de Minas, no estado de Goiás ou no estado do Rio de Janeiro, temos uma atuação muito próxima das comunidades. Estamos bem presentes ali com os nossos times, para entender realmente quais são as necessidades e traduzir isso em ações que estão dentro do nosso plano de negócio.

É possível conciliar mineração com meio ambiente?

               É muito possível. Não é só possível, dentro da nossa realidade, se não for dessa forma, vai contra os nossos valores. Falando da Anglo American, nós temos como grande propósito, reimaginar a mineração para melhorar a vida das pessoas. É muito sério isso. Quando se pega essa frase, pode soar uma frase bonita, mas, por trás de cada pa[1]lavra que compõe essa frase, tem uma intenção e uma ação muito forte de, realmente, fazer o que é certo.

             Quando pensamos no meio ambiente, todas as nossas ações de monitoramento de ruído, das nascentes, monitoramento de água, todos os nossos controles ambientais, toda a forma como a gente lida com os temas nossos de compensações ambientais, temos uma responsabilidade muito grande, não só cumprir o que é a legislação, que já é bastante rigorosa, como tem que ser, mas garantimos que estamos fazendo tudo isso para deixar um impacto positivo na vida das pessoas e naquele nosso entorno. Então é sim, é muito possível, sim, casar as duas coisas, mineração e todo o cuidado com o meio ambiente.

             A economia brasileira está praticamente parada. o mundo também enfrenta problemas com as guerras. como é que está o mercado de minério, diante dessa situação?

            Ficamos acompanhando porque o grande termômetro para a gente acaba sendo a China, até pela questão da própria precificação do minério de ferro. Já a questão do níquel, outra commodity que temos aqui, nós acabamos monitorando muito o comportamento da Indonésia. E fica a expectativa em relação ao que virá de investimento do governo chinês, como vai se comportar a indústria do aço e como vão se comportar aí os outros players, as outras mineradoras, com suas expectativas de volume de produção para entender sobre oferta e demanda.

          O nosso produto, o minério de ferro, é um produto premium, um produto que tem baixíssimo índices de sílica e outras características que garantem uma alta pureza. Então, ele tem um mercado muito específico, que é o mercado das indústrias siderúrgicas que estão realmente indo para essa caminhada da indústria do aço verde. Tem uma demanda muito grande do nosso produto, pela pureza dele. Mas é claro que não deixamos de sentir as contrações de demanda.

 

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