Deusa Prado: “Acho que minha comida vai ficar na memória afetiva das pessoas por muitos anos”
Fotos:Pedro Vilela \Agência 17
Nordestina de riso farto e personalidade expansiva, Deusa Prado fez do Alguidares uma referência em BH quando o assunto são ingredientes de qualidade e boa moqueca
“A Bahia é muito sensorial, cheia de cores, cheiros e sabores. Quando as baianas saem para catar siri, elas se banham e se perfumam inteiras. E, mesmo após voltar do trabalho, continuam cheirosas. Por isso é que por lá não falamos ‘um beijo’, falamos ‘um cheiro’. Nossa comida desperta muita curiosidade e atrai pela sua história”, reflete Deusa Prado, proprietária do restaurante Alguidares, casa especializada em peixes e frutos do mar.
Inaugurado no dia 2 de fevereiro, Dia de Iemanjá, em 1996, o restaurante se destaca não apenas por sua longevidade no mercado, mas também pelo prestígio que angariou entre os mineiros ao longo de sua trajetória. “Temos um cardápio enxuto e servimos praticamente as mesmas coisas há quase 28 anos. Essa consistência fez com que a gente se especializasse e, consequentemente, a qualidade só tende a aumentar”, afirma.
Natural de Feira de Santana, a chef também volta às origens para buscar os melhores ingredientes e garante que isso ajuda no sucesso da casa. “Sou muito exigente com os insumos, é fundamental que tudo seja de muita qualidade. Usamos camarão de cativeiro, o que reduz o risco de infecções, e o siri vem de uma comunidade da ilha de Itaparica. O que mudou do início para cá foi a facilidade em relação ao acesso. Antes eu ia buscar os ingredientes de avião e, hoje, muita coisa chega na porta da minha casa”, revela.
No entanto, ela pontua que não adianta ter bons insumos se os processos não valorizarem esses ingredientes. “O maior erro que um restaurante igual ao meu pode cometer é cozinhar demais o camarão. Isso faz com que ele desidrate, fique duro. O que precisa cozinhar por mais tempo são os outros ingredientes, é isso que vai garantir o sabor. A proteína só entra no final”, ensina.
Por lá, é justamente o camarão que bate o recorde de pedidos e se mantém firme na preferência dos clientes. Porém, alinhado com os novos tempos, o Alguidares não deixa de atender às novas formas de consumo. “A moqueca de camarão é nosso carro chefe, é nisso que focamos desde o início e cerca de 65% dos pedidos são desse prato. Mas, também vimos crescer o consumo das moquecas veganas, que levam coco verde e banana da terra. Antigamente quase ninguém pedia, mas atualmente os clientes têm aprendido a apreciar outros sabores”, diz.
O mais curioso disso tudo é que, quem vê todo esse domínio na arte gastronômica, nem imagina que Deusa era pouco habituada ao mundo das panelas. “Nasci em uma família que não me deixava entrar na cozinha. Me casei cedo, aos 18 anos, e foi a partir daí que comecei a aprender a fazer alguns pratos”, relembra.
Tão inusitado quanto isso é pensar que a comida baiana, que a tornou famosa em Belo Horizonte, não estava em seus planos quando ela decidiu abrir seu próprio negócio. “Nunca foi minha intenção servir comida desse tipo. Quando comecei a pensar no nicho do meu restaurante, percebi que praticamente não havia lugares de comida baiana na cidade. Foi aí que decidi investir nesse filão”, conta.
Questionada sobre como imagina o Alguidares nos próximos anos, Deusa evita malabarismos e mira na simplicidade. “Acho que minha comida ainda vai ficar na memória afetiva das pessoas por muitos anos. Não fazemos invencionices e nem tentamos reinventar a roda. Trabalhamos com o tradicional, com o que o cliente já conhece e isso funciona bem. São receitas muito bem-feitas, que o cliente sabe que pode voltar e vai encontrar a mesma qualidade. Isso é o que garante que eles voltem, apresentem para outras pessoas e é o que vai manter o restaurante vivo no futuro”, aposta.