Cultura

Fábrica de sonhos

Fábrica de sonhos

Maria Júlia Meneghin: “realização de um sonho de infãncia”

Foto:Alessa Fotografia

 

Mercado de festas de 15 anos se fortalece pós-pandemia.

Cerimonialistas apontam que o orçamento único desse

nicho de eventos é mais alto que o de casamentos

 

              As debutantes nunca estiveram tão em alta. Embora não haja números oficiais, a percepção de profissionais do setor de eventos é que as cifras das festas de 15 anos ultrapassam as registradas em casamentos, que, historicamente, são o foco principal deste mercado. É que, em vez de restrição de convidados, como sinaliza a tendência dos miniweddings, as adolescentes “bem-nascidas” sonham com festas cada vez mais grandiosas e luxuosas, em uma espécie de competição de quem festeja “melhor”. Os pais, por sua vez, estão inclinados a realizar o sonho das filhas, e abrem o bolso, generosamente.

 

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André Ávila, Fabíola Novaes e Bruna Billet, da Best: ligados nas novidades

 

                “Em Belo Horizonte, uma festa caprichada fica em torno de R$ 500 mil a 600 mil, com média de R$ 1,2 a R$ 1,5 mil por convidado. Mas, dependendo do orçamento e das atrações, pode chegar a R$ 20 milhões. O céu é, de fato, o limite”, crava a cerimonialista Simone Barros, sócia-proprietária da UP Produções. Com cerca de duas décadas de experiência no setor de eventos, ela se especializou em celebrações de 15 anos: o nicho corresponde a cerca de 80% da demanda da empresa, em uma agenda movimentada de quatro a seis festas por mês, números que só se fortaleceram depois da pandemia.

               O período forçado de stand-by também acelerou tendências. “Hoje, não temos mais festas sem atração musical, isto é, a apresentação de um artista famoso, que passou a ser o diferencial do evento”, relata Simone. Entram nesta lista nomes desejados da música eletrônica, como os DJs Vintage Culture, Dillon, Cat Dealers e Kvsh. “DJs renomados dificilmente tem cachê inferior a R$ 120 mil”, calcula a produtora.

               O evento-espetáculo tem como desafio o gosto volátil das aniversariantes. “A gente precisa estar ligado às novidades, as meninas mudam de ideia muito rápido. Há alguns anos, elas só queriam saber de música eletrônica; depois, veio a onda do funk; e, por fim, a mescla de funk e eletrônico. Agora, as mais antenadas querem artistas de trap, subgênero do rap e do hip-hop, com toques de house”, relata André Ávila, diretor e proprietário da Best Produtora, que promove em torno de 40 shows para aniversários de 15 anos por mês.

               Foi a Best, inclusive, a responsável por trazer o DJ Alok para a badalada festa da filha do banqueiro Daniel Vorcaro, realizada em agosto, em uma mansão do condomínio Miguelão, em Nova Lima. “Uma festa fechada com o Alok está na faixa de R$ 800 a R$ 900 mil. Também já realizamos uma festa com o DJ Vintage Culture, com cachê em torno de R$ 600 mil”, revela o produtor. Mas há produções mais acessíveis, evidentemente. “Quando o orçamento é menor, as opções são os MCs de funk, como Kevinho, WS da Igrejinha, G15 e Wesley Gonzaga. Além disso, temos também o nosso próprio casting de DJs”, relata. Sertanejo? Em Belo Horizonte, nem pensar. “Só tem procura no interior.”

               Para conseguir espaço na disputada agenda dos artistas, o tempo ideal de negociação seria de pelo menos um ano antes do evento. Mas isso antes da pandemia. Mais veloz, o mercado reduziu o timing de seis a oito meses. Até menos. “Já fechamos muitas atrações com antecedência de três a quatro meses; algumas, até de um mês para o outro”, diz Ávila. Foi o que aconteceu com Maria Júlia Meneghin: embora tenha iniciado o planejamento com sete meses de antecedência, de última hora, ela decidiu que, além do DJ Dub Flow, também queria que a festa, realizada em novembro, tivesse uma atração musical. A cerimonialista teve que correr contra o tempo, mas conseguiu contratar o MC L da Vinte, expoente do funk mineiro.

 

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                Em ritmo de pancadão, o conto de fadas moderno também teve seu toque romântico, com direito à tradicional valsa com o pai, o tio, primos e alguns amigos. “Foi emocionante, a realização de um sonho de infância. Queria também valsar com meu avô, mas ele está muito velhinho e não conseguiu. Porém, eu o homenageei com um buquê de rosas”, conta Maria Júlia. A decoração, aliás, abusou das flores e de variados tons de cor- -de-rosa; a cenografia contou ainda com um lago e um ponte sobre ele. A festa para 180 convidados, no espaço Mariangela, no Jardim Canadá, teve investimento médio de R$ 300 mil. A aniversariante afirma que o pai, empresário do ramo da metalurgia, foi generoso para além das decisões financeiras. “Juntamente com a minha mãe, ele deu suporte emocional e participou na escolha de detalhes importantes”, diz.

                À frente da DC Eventos e uma das principais cerimonialistas do segmento das festas de 15 anos em Belo Horizonte, Daniele Cerqueira foi quem assinou a festa de Maria Júlia. Dani Cerqueira, como a profissional é conhecida, encontrou sua paixão pelo público jovem desde os primeiros estágios na faculdade de Relações Públicas, marcando presença em boates icônicas dos anos 1990, como a saudosa L’Apogée. Ao longo dos anos, sua jornada a levou a explorar diversos segmentos, desde casamentos, formaturas e eventos corporativos. “Mas encontrei minha verdadeira vocação na celebração dos 15 anos. É um momento único, onde eu posso usar a criatividade, ser lúdica. Eu me realizo demais e trato as aniversariantes como se fossem minhas filhas”, expressa ela.

               Buscando atender os desejos de todos os bolsos e gostos, Dani criou a mostra My Fifteen, em 2015, com a apresentação de diversos fornecedores do setor. “Uma festa de 15 anos envolve mais de 40 profissionais: fotógrafo, cinegrafista, cabeleireiro, maquiador, decorador, designer gráfico, empresas de bufê, trabalhadores de limpeza, ambulância… Sem a conexão com todos esses parceiros, é impossível que o evento aconteça”, afirma. Outro ponto importante, segundo a cerimonialista, é a escolha do local. Salões do Jardim Canadá, como Casa Tua, BHZ, Mix Garden, Mariangela e Contemporâneo Hall despontam no topo da lista dos lugares mais procurados. Dentro da área urbana, os destaques ficam para a Casa Bernardi, no Cidade Jardim; o Buffet Catharina, no Estoril; a Das Haus, no Buritis; o Liac e o Treville, na Pampulha.

 

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Dani Cerqueira: diferenciação de espaços para adultos e adolescentes

               Dani também introduziu no mercado conceitos inovadores, como a Home Balada, uma celebração mais intimista, para até 60 convidados, realizada na casa da aniversariante. “Esse modelo nasceu de uma cliente que, a poucas semanas da megafesta planejada, decidiu cancelar tudo, pois os pais optaram por presenteá-la com um apartamento. Mas, como a vontade de festejar ainda era grande, sugeri essa solução. Foi um sucesso e passou a ter grande aceitação.”

               Com a produção de três a quatro festas por mês, Dani Cerqueira contabiliza que as festas mais modestas giram a partir de R$ 600 por convidado; já os eventos mais luxuosos alcançam cifras de R$ 2,5 mil por pessoa – os valores astronômicos, na casa dos milhões, segundo a profissional, existem, mas são exceção. “A decoração é um dos itens mais caros e um termômetro para fixar o valor do evento. No mercado pós-pandemia, as flores se tornaram um item de destaque. Assim como a diferenciação de ambientes para adultos e adolescentes tornou-se crucial”, aponta ela.

               O checklist efervescente das festas de debutantes também passa pela identidade visual particular de cada evento. O conceito vai muito além da simples produção dos convites, abrangendo toda a comunicação da celebração, representando-a por meio de símbolos, cores e tipografias padronizados. “Muitos convites são desenvolvidos para além da simples impressão gráfica: são produtos que envolvem tecnologias contemporâneas e demandam cuidado especial na logística e no transporte”, conta a designer gráfico Erika Gomes, mente criativa por trás da La Santé.

               Clássicos, românticos ou irreverentes, os convites do momento buscam refletir a essência e a estética da festa. Entre eles, um dos destaques foi o convite da debutante Hayumi: uma caixa que, quando aberta, revelava uma lanterna japonesa. Já as aniversariantes Maria Clara e Duda preferiram seguir a linha high tech, por meio de convites-box com projeção de hologramas. “Antes, escolher convites envolvia folhear catálogos de formatos pré-determinados. Hoje, o público quer algo exclusivo, tanto no formato físico quanto digital”, relata a designer.

 

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Erika Gomes: “público quer algo exclusivo”

               Com 12 anos de atuação, a La Santé concentra mais de 60% da demanda nas celebrações de 15 anos. Depois de um período em stand-by, durante a pandemia, Erika observou o rápido crescimento do digital também para esse mercado. Nasceu, então, a Code My Party, um sistema de gestão e controle de convidados por meio de QR code. “Ao confirmar a presença no link do convite, o convidado cadastra seu nome, telefone, e-mail e foto, validada por biometria facial. Na sequência, recebe um código individual e intransferível. No dia do evento, fazemos a leitura pelo celular, com conferência e atualização automáticas da lista”, descreve. Com mais de 700 eventos executados pela plataforma em dois anos – e não apenas em Belo Horizonte – Erika garante zero problemas com a leituras de códigos. “É uma tecnologia com perfeita funcionalidade”, assegura.

Vista grossa para o Álcool

Presente em 9 entre 10 das festas de 15 anos, a bebida alcoólica é uma polêmica para a qual se faz vista grossa. Embora seja proibida a menores por lei federal (13.106/2015), são os pais e responsáveis que dão a palavra final. E, na maioria dos casos, eles autorizam, rendendo-se a pedidos da aniversariante, para evitar que a festa “flope”. Na linha da “redução de danos”, o cardápio de bebidas usa de alguns truques: evita cervejas e destilados mais fortes e aposta em drinques com saquê e teor alcoólico reduzido, por meio do uso de um dosador que leva menos quantidade da bebida – mas sem que o adolescente perceba. Se a ida ao bar é recorrente, os bartenders são orientados a substituir a dose de álcool por água com limão, que, em tese, potencializa o sabor do drinque.

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