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No final do século 19, às vésperas da Proclamação da República, Machado de Assis, em O câmbio e as pombas, reclamara: “que quer o senhor que eu faça com este câmbio a 9?” Naquela época, a taxa de câmbio era expressa na quantidade da moeda inglesa equivalente a um mil-réis. E, se já estava difícil conviver com o câmbio a 9 pence, o que dizer quando a conversação do mil-réis caiu para 8? “Dois círculos, um por cima do outro… Um par de olhos tortos e irônicos” observara o escritor, já desiludido.
Há três décadas, no final de fevereiro de 1994, a inflação mensal estava a 42,3% e a anual passava de 3.000%. Conforme registrado nos arquivos do Senado Federal, às vésperas de o governo encaminhar ao Congresso a primeira MP do Plano Real, criando a Unidade Real de Valor (URV), o senador Nabor Júnior (PMDB-AC) pôs a hiperinflação brasileira em termos concretos e práticos: “O pãozinho francês de 50 gramas, que é a alimentação básica da população brasileira, na semana passada custava CR$ 38 [cruzeiros reais] e hoje está sendo comprado a CR$ 58”. Em sete dias, mais de 50% de aumento. E acrescentou: “Não podemos admitir que isso ocorra num tempo democrático e fundado nos direitos sociais”.
Hoje, a inflação anual (4,2%) é apenas 10% da inflação mensal de trinta anos atrás! É discutido se, para que caia até 3% (centro da meta) no horizonte relevante, o Banco Central irá manter a taxa de juros em 11,25% ou reduzi-la, gradativamente, até chegar a 9%, no final do ano. O que diria Machado de Assis?
Ciente do que ocorria mundo afora, a equipe de FHC não teve dúvidas, ancorou a URV no dólar, para sossego do Bruxo do Cosme Velho.
A ousadia e a coragem de Itamar Franco e FHC, responsáveis por mudança tão profunda na economia brasileira, restabeleceram a normalidade monetária, abriram caminho para o crescimento e preservaram a democracia. O país tem ainda muitos problemas, mas na macroeconomia eles são menos complexos do que foram outrora, como indica, por exemplo, o conflito entre governo e Banco Central sobre taxa de juros, equilíbrio fiscal, inflação e crescimento. Preservar o poder aquisitivo da moeda é a mais importante das políticas sociais. Vida longa ao Real no seu aniversário de 30 anos.