Meio Ambiente

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Índice de Vulnerabilidade Climática: 528 municípios mineiros estão em risco alto, muito alto ou extremo

Foto:Reprodução

 

Com 62% de seus municípios em risco de vulnerabilidade, devido aos efeitos das mudanças climáticas, Minas Gerais se mobiliza para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e conscientizar a população

 

          O ano de 2023 foi o mais quente da história. No mês de novembro, os termômetros de Minas Gerais marcaram recordes em várias cidades, chegando a bater 44°C no Vale do Jequitinhonha. Belo Horizonte atingiu 38,6° C em 25 de setembro, a maior temperatura já registrada, e foi a capital brasileira que mais sofreu com o aquecimento no último ano, chegando a registrar 4,2° C acima da média, segundo o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden). Além do próprio desconforto, as ondas de calor extremos são responsáveis por provocar tragédias climáticas, como as enchentes no Rio Grande do Sul e a seca na Amazônia.

         O cenário apocalíptico também é muito preocupante em Minas. Dos 853 municípios do estado, 528 (62%) deles estão em risco de grau alto, muito alto ou extremo, segundo o relatório mais atualizado do Índice Mineiro de Vulnerabilidade Climática, divulgado na Semana do Meio Ambiente de 2024, neste junho de 2024. As consequências incluem menor renda, maior desemprego, aumento nas internações por doenças infecciosas e respiratórias, além de redução significativa na quantidade de água disponível, de florestas, na biodiversidade e na qualidade de vida. Criado em 2014, o índice ainda aponta que algumas regiões tendem a sofrer mais com a diminuição das áreas de cultivo agrícola, como o Vale do Jequitinhonha, o Alto Paranaíba e a Zona da Mata; e o processo de desertificação, a exemplos das regiões Norte e do Jequitinhonha. O Sul de Minas, por sua vez, é o mais vulnerável ao aumento de precipitações e desastres.

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Operação Mata Atlântica Em Pé: dados recentes mostram queda no desflorestamento

         Para a realidade de cada território, a plataforma leva em consideração indicadores de saneamento, renda per capita local, cobertura vegetal, entre outros fatores, possibilitando base técnica para subsidiar processos de tomada de decisão no alto escalão mineiro. Por meio da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), o Governo de Minas relata uma série de estratégias de políticas públicas para lidar com os efeitos das mudanças climáticas. Entre as mais importantes, está a elaboração do Plano Estadual de Ação Climática de Minas Gerais (Plac-MG), em 2023, uma atualização ao Plano de Energia e Mudanças Climáticas do Estado de Minas Gerais (PEMC), de 2014.

        Como instrumento de planejamento estratégico, o Plac-MG define 28 ações, 103 subações e 199 metas para a redução das emissões de gases de efeito estufa no âmbito estadual até 2050 e está interconectado com outras estratégias, como o Plano Mineiro de Segurança Hídrica (PMSH), ainda em elaboração, e a Política Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional. Os recursos financeiros disponíveis totalizam aproximadamente R$ 81,6 milhões, valor que deve ser atualizado com o passar dos anos. Até o momento, já foram monitoradas 41 dessas metas, gerenciadas pela Superintendência de Qualidade Ambiental e Mudanças Climáticas, órgão da Semad criado em outubro de 2023, especificamente para tratar dessa temática, que antes era da competência da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam).

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“A composição do plano envolve todas os componentes necessários para uma intervenção ampla e integrada: energia, transporte e mobilidade, resíduos, indústria, agropecuária, biodiversidade e ecossistemas, segurança hídrica, segurança alimentar e bem como a necessidade de ações mitigadoras e adaptativas. No Plac, essa questão vincula direitos humanos e desenvolvimento de baixo carbono para alcançar uma abordagem que respeite o meio ambiente, salvaguarde os direitos das pessoas mais vulneráveis e compartilhe os encargos e seus impactos de forma mais equitativa e justa”, informa Araújo.

          Outra iniciativa importante em nível estadual é o projeto Clima na Prática, em parceria com o governo da França, elaborado em 2019 e atualizado em 2024, para apoiar os pequenos e médios municípios mineiros no gerenciamento do planejamento climático. Somente ao longo do primeiro semestre deste ano, o programa realizou oficinas regionais em cidades de diferentes regiões do estado – Montes Claros, Juiz de Fora, Itabira, Coronel Fabriciano, Muriaé, São João da Ponte e Guiricema –, escolhidas com base no Índice Mineiro de Vulnerabilidade Climática. “A ferramenta é voltada a prefeituras que não possuem políticas públicas ligadas ao clima ou que querem validar ou medir suas ações de acordo com uma referência. Tanto na França quanto em Minas, é um produto auxiliar do Plac, guiando no desenvolvimento e na implementação de ações nos mesmos moldes do plano estadual”, diz Renata Araújo.

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          A superintendente conta que Minas Gerais retomou as tratativas de cooperação com a França em 2022, em continuidade às contribuições anteriores realizadas pela Agência Francesa de Desenvolvimento (AFD). Naquele ano, o governo francês aprovou a proposta da seleção do envio um colaborador internacional para apoiar o Estado na construção de agenda e ações nos municípios. O intercâmbio teve início em novembro de 2023, com a chegada a Belo Horizonte da francesa Barbara Crepet, assessora técnica em mitigação e adaptação às mudanças climáticas.

 “Até 2026, ela irá prestar apoio à nossa superintendência em ações para ampliar a capacidade do Estado em lidar com os desafios do aquecimento e promover a sustentabilidade ambiental em níveis municipais”, conta Araújo. Também está em curso o plano de que o Clima na Prática seja adaptado a um curso on-line na plataforma “Trilhas do Saber” do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema), no primeiro semestre de 2025, voltado para a capacitação de gestores públicos municipais.

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         Mais recentemente, na Semana do Meio Ambiente 2024, o governador Romeu Zema e a secretária de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Marília Melo, assinaram um memorando de colaboração mútua entre a Embaixada da França no Brasil e o Governo de Minas, visando à neutralidade de emissões de gases de efeito estuda, à adaptação e à resiliência do território mineiro frente às mudanças climáticas. A cooperação passa pela educação ambiental, por meio da sensibilização dos alunos da rede estadual e organização de palestras e exposições pedagógicas gratuitas. “É fundamental criar uma conscientização na população em relação à urgência das ações climáticas. As pessoas precisam compreender que uma diferença de temperatura de 1,5°C ou 2°C não é algo que afeta apenas uma área geográfica específica; mas tem impactos globais significativos, que reverberam localmente. E essa é uma grande dificuldade, já que muitos ainda não têm a dimensão do que isso significa, da urgência e seriedade desse assunto”, pondera a secretária Marília Melo.

         Os esforços de Minas também se refletem na adesão, em 2020, à campanha global Race to Zero, que visa alcançar emissões líquidas zero de gases de efeito estufa até 2050. “Com a assinatura, retomamos fortemente a agenda climática em Minas Gerais, avançando em mais um passo importante para a implementação da política de mudança do clima, mas, sobretudo, do nosso Plano de Ação Climática”, diz Marília Melo. Ela pontua que Minas foi primeiro estado subnacional da América Latina e Caribe, a assinar o acordo, juntamente com a Federação das Indústrias de Minas Gerais (Fiemg) e a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg).

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          “Um dos principais resultados até o momento foi a redução do desflorestamento. Minas Gerais registrou uma queda de 57% no desmatamento do bioma em 2023, em comparação a 2022, de acordo com os dados mais recentes do Atlas da Mata Atlântica”, compara o presidente da Fiemg, Flávio Roscoe. A Fiemg, a propósito, relata atuar em diversas frentes para auxiliar no combate às mudanças climáticas. “Recentemente, a entidade firmou termo de cooperação com a ArcelorMittal para criar o Centro de Descarbonização Industrial, que receberá investimentos da ordem de R$ 34 milhões e terá equipamentos que permitem a realização de testes e condução inicial de projetos de descarbonização, auxiliando as empresas mineiras na diminuição das emissões de gases de efeito estufa. Além disso, criamos, em 2022, o Programa Missão Carbono Zero, para apoiar as indústrias nas estratégias de descarbonização e elaborar inventários de gases de efeito estufa das indústrias”, contabiliza Roscoe.

          Minas Gerais também participou efetivamente da COP28, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em Dubai, entre novembro e dezembro de 2023. O vice-governador, Mateus Simões, e a secretária Marília Melo, participaram de painéis técnicos e encontros para troca de experiências internacionais. A comitiva apresentou 57 atividades, projetos e programas desenvolvidos por meio de parcerias com a iniciativa privada em prol da sustentabilidade no estado, distribuídos por temas como energia, recursos hídricos, agricultura, pecuária e florestas. Outro destaque foi o anúncio da implantação da calculadora MRV Climático, em que a sigla “MRV” responde por “Mensuração/Monitoramento, Relato e Verificação”: a ferramenta busca gerenciar os impactos das ações implementadas pelo Plac-MG, mensurar as emissões de gases de efeito estufa evitadas e o estoque de gás carbônico, além de possibilitar a apresentação de resultados da trajetória de descarbonização em Minas Gerais.

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