Saúde

Esperança contra o câncer

esperanca contra o cancer

Vanderson Rocha: “Espera-se avanço nos chamados cânceres sólidos

Foto:Divulgação

 

Estudo com CAR-T Cell autorizado pela Anvisa é uma das novidades
na busca pela cura da doença

 

               No final de setembro, uma notícia encheu de esperança os pacientes vítimas da leucemia linfoblástica B e do linfoma não Hodgkin de células B. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) anunciou a autorização do estudo do tratamento revolucionário com CAR-T Cell para estendê-lo à rede de saúde pública. A medida permitirá, inicialmente, que 81 doentes compassivos, que já tenham passado por todo tipo de procedimento, como quimioterapias e transplante de medula óssea possam participar do estudo clínico, que consiste na coleta do sangue, onde os linfócitos T (células com função imunológica) são separados em laboratório para serem geneticamente modificados e infundidos no corpo, onde espera-se, que travarão uma guerra de destruição das células tumorais.

               Realizado nos Estados Unidos desde 2012, o CAR-T Cell vem sendo realizado no Brasil recentemente na rede privada. O custo da modificação celular em laboratório para infusão em cada paciente, gira em torno de R$ 2 milhões. Mas, pode ser reduzido dez vezes, conforme expectativa dos pesquisadores, o que poderá ser a salvação de centenas de pacientes através do SUS.

               “O que a Anvisa está nos autorizando a fazer é selecionar esses 81 pacientes para participarem do tratamento. Eles serão recrutados pelo Comitê Científico. Os escolhidos passarão por infusão de células CAR-T, produzidas no Hemocentro de Ribeirão Preto, em colaboração com a USP de Ribeirão Preto, a USP de São Paulo e o Instituto Butatã. Ao final do estudo, poderemos chegar a uma comprovação da redução estimada do custo comparado ao praticado na rede privada para obter as células CART. A adoção pelo SUS poderá ocorrer em um prazo estimado de dois a três anos. E a Fiocruz já demonstrou interesse em produzir o vetor para baratear”, relata o professor da Faculdade de Medicina da USP de São Paulo, médico hematologista e coordenador nacional de terapia celular da rede D’or, Vanderson Rocha.

               A terapia com células CAR-T é um dos destaques na esteira de avanços por que passam os estudos recentes em direção ao diagnóstico precoce e os caminhos para a cura de alguns tipos de cânceres. Os médicos envolvidos já trataram 15 pacientes com CAR-T Cell. Dez tiveram sucesso com a terapia. “O primeiro deles, um paciente que teve remissão completa do câncer, mas, pouco depois morreu em razão de um acidente doméstico”, descreve o professor da USP. Outros quatro também morreram. Dois por infecção decorrente da doença e dois por recaída.

 

 

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Paulo Peregrino e Vanderson Rocha:
remissão da doença após o tratamento

               O médico Vanderson Rocha, que tratou também do 14º paciente, o publicitário, escritor e palestrante Paulo Peregrino, conta que em um mês houve remissão completa do câncer. “Ele fez o primeiro PET Scan depois de seis meses em que deixou o Hospital das Clínicas, em São Paulo, e continua sem qualquer sinal de câncer após o tratamento com o CAR-T Cell. Isso nos deixa entusiasmados. Ele passou 13 anos na luta contra a doença e esteva prestes a receber cuidados paliativos. O tipo de câncer diagnosticado era o linfoma não Hodgkin de células B. Essa terapia celular é indicada para três tipos de câncer, mas no Brasil, o estudo clínico está autorizado só para o caso do Peregrino e a leucemia linfoblástica B”, aponta o professor.

               O outro tipo de câncer onde a terapia celular obteve sucesso, mas fora do Brasil, é o mieloma múltiplo. A Anvisa ainda não autorizou o estudo clínico para esse caso. “O tratamento com CAR-T Cell ocorre no que chamamos de câncer líquido. Passei três semanas em Nova York para estudar outros casos. Espera-se um avanço no tratamento dos chamados cânceres sólidos. Mas, aqui no Brasil, é preciso atentar para a necessidade de investimento em pesquisas. Não se pode contar só com o governo. Tenho batido muito na tecla de que é preciso um envolvimento por parte da sociedade civil, que ela invista também, como fazem em outros países”, alerta o médico Vanderson Rocha.

               Enquanto isso, quem comemora a boa forma é o publicitário Paulo Peregrino. Depois de mais de uma década na luta contra a doença, e de constatar a remissão completa do câncer em apenas um mês de terapia celular, o publicitário, de 61 anos, acredita que tem mais fôlego que as sete vidas do gato. Faz sentido. “Passei por quatro cânceres, tive septicemia, fiz transplante de medula, 45 sessões de quimioterapia, tive púrpura, fiquei três meses com a visão parcial devido a uma hemorragia nas duas retinas e, como é sabido, lutei 13 anos contra o câncer”, contabiliza Peregrino.

               Em maio, depois de um mês do tratamento, o publicitário foi para casa, em Niterói, com a mulher, o filho e reencontrou o cachorro. Sem sinal do câncer e cheio de planos, não vê a hora de voltar a jogar vôlei de praia, mas antes, precisa recuperar a massa muscular perdida nos meses em que ficou acamado. Peregrino criou um canal no Instagram, onde faz lives aos domingos e às quintas, às 19h30. O nome, “Fé e Ciência” retrata, segundo ele, as duas coisas que sempre estiveram presentes na sua vida. Ele pretende que o canal vire uma rede de compartilhamento de informações com pessoas que passam ou passaram pelos mesmos dramas que viveu. Paulo Peregrino seguirá fazendo PET Scan a cada seis meses e hemograma a cada 15 dias. De acordo com o professor Vanderson, apesar dos pacientes apresentarem remissão no câncer, só se fala em cura depois de cinco anos.

               O aumento da longevidade, a baixa qualidade de vida, o consumo de alimentos ultraprocessados, o estresse e o sedentarismo são fatores que contribuirão com maior surgimento de cânceres. Essa percepção faz parte do senso comum. Mas, há que se comemorar muitas conquistas recentes no diagnóstico precoce de alguns tipos de câncer e nos avanços tecnológicos para o tratamento.

               NA ROTA DOS AVANÇOS

                “A imunoterapia foi, sem dúvida, a grande virada de chave nos últimos dez anos. Muitos tumores têm formas de se esquivar, de esconderem do sistema imunológico. Os tratamentos são promissores para os anos que seguem em cânceres de bexiga, colo do útero, mama, etc”, prevê o oncologista Gélcio Luiz Quintella Mendes, coordenador geral de Assistência do Instituto Nacional do Câncer (Inca), órgão auxiliar do Ministério da Saúde, que atua no controle e prevenção da doença no Brasil.

               De acordo com o médico, o conjugado de corpo monoclonal a elementos radioativos é uma promessa para o câncer de próstata. “Outra coisa interessante é o uso de drogas-alvo para os tumores no pulmão e no rim, que já tem autorização para uso no SUS. Há, ainda, o abiraterona, parte hormonal, para o tratamento da próstata. No caso do câncer de mama avançado ou metastático, há a alternativa do uso do inibidor de ciclina já presente na saúde suplementar”, acrescenta o oncologista do Inca.

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Gélcio Mendes: imunoterapia foi a
grande virada de chave

 

              O especialista Gélcio Mendes aponta outras tecnologias pouco invasivas de grande interesse na oncologia. “Hoje, você tem o radiologista intervencionista. Na tomografia, com agulha ou cateter, ele atua tanto para retirar material para exame diagnóstico, como para tratar várias doenças, inclusive oncológicas, podendo evitar cirurgia”, enfatiza.

              O PET CT é outro equipamento de imagem que veio para agregar. É usado para o caso de suspeita de câncer, mas, também para análise do tumor. Já as aplicações da medicina molecular são de enorme valia. O teste genético e a patologia molecular para investigar o tipo de câncer de mama, sabendo que existem, pelo menos quatro tipos, permitem que, ao encontrar qual seja, será possível definir a linha de tratamento”, completa Mendes.

               Mas, o especialista do Inca alerta sobre os fatores de riscos que devem estar sempre na pauta. “Sabemos que a incidência é crescente com a longevidade, mas é preciso estar ciente que entre os grupos de fatores de riscos existem aqueles que são modificáveis. Por exemplo, o câncer de pulmão tem de 80% a 90% das causas produzidas pelo cigarro. O de endométrio está associado a obesidade em 60% dos casos. O consumo de álcool é fator de risco para vários tipos de cânceres, incluindo, claro, o de fígado. O exercício físico ajuda na prevenção e o excesso de exposição ao sol também traz risco à pele”, enumera o médico.

               E por falar em prevenção, o oncologista fez questão de lembrar que outra forma de contribuir para a prevenção é através de vacina. “Costumo dizer que são vacinas contra o câncer a de hepatite B, porque diminui o risco no fígado, e a HPV para meninos e meninas de 9 a 15 anos, que devem ser tomadas em duas doses, antes do início da vida sexual e depois de iniciá-la, porque também ajuda na prevenção do câncer do canal anal e da garganta. São oferecidas gratuitamente nos postos de saúde, pelo SUS”, lembra Gélcio Mendes.

              Em outro grupo de risco estão os cânceres genéticos, por causas hereditárias. São mais ou menos 5% dos tumores com história familiar, segundo Mendes. “Neste caso, é preciso fazer o rastreamento de tempos em tempos para diminuir o risco. Além disso, ainda é possível prevenir, por exemplo, nos casos de pólipo familiar presente no intestino, que pode evoluir para um câncer de cólon (intestino grosso) se não retirado a tempo.

SERVIÇOS –

E-mail para os médicos encaminharem o relatório de seus pacientes com leucemia linfoblástica B ou linfoma não Hodgkin de células B para o Comitê Científico que irá recrutar os 81 candidatos ao tratamento do CAR-T Cell: terapia@hemocentro.fmrp.usp.br

Endereço do canal “Com Fé e Ciência”, do publicitário Paulo Peregrino, paciente que teve remissão completa do câncer, através da terapia celular. As lives que podem ser acompanhadas pelo instagram @paulocfperegrino têm o objetivo de formar uma rede de troca de informações com pacientes curados e os que estão em tratamento e os familiares dos mesmos.

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