Cultura

As estrelas de Minas

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Bárbara Colen: “Atuar nestes filmes foi um ponto de virada da minha carreira”

Foto: Léo Lara

 

 

27ª edição da Mostra de Cinema de Tiradentes homenageia dois talentos mineiros, o cineasta André Novais Oliveira e a atriz Bárbara Colen

 

           A sétima arte produzida em Minas e a partir de Minas definiu o teor das homenagens da Mostra de Cinema de Tiradentes, realizada em janeiro. Em sua 27ª edição, o evento homenageou não apenas um, mas dois mineiros: André Novais Oliveira e Bárbara Colen. Ele, cineasta nascido em Contagem, cofundador da produtora Filmes de Plástico, assinou alguns dos filmes mais premiados dos últimos anos, como “Temporada” (2018), que conquistou o troféu de Melhor Filme do Festival de Brasília daquele ano; e “O Dia que te Conheci” (2023), vencedor do Grande Prêmio do Festival de Belfort, na França. Ela, atriz nascida em Belo Horizonte, integrou o elenco de “Aquarius” (2016) e “Bacurau” (2019), ambos do recifense Kleber Mendonça Filho, que estrearam mundialmente no Festival de Cannes, e protagonizou “Breve miragem de sol” (2019), “Fogaréu” (2023) e o ainda não lançado “O Silêncio das Ostras”.

          Para além da geografia, os caminhos do cineasta e da atriz se cruzam na essência, no ato político de dar voz a personagens e cenários periféricos. Bárbara estreou no curta “Contagem” (2010), assinado por Gabriel Martins e Maurílio Martins, sócios da Filmes de Plástico, sediada, justamente, em Contagem. Atuou ainda em “Baixo Centro” (2018), de Ewerton Belico e Samuel Marotta, que se passa em ruas “esquecidas” do centro da capital mineira; e “Dia de Reis” (2018), de Marcos Pimentel, ambientado no sertão do Norte de Minas. André, por sua vez, reverencia a região metropolitana de Belo Horizonte como protagonista, a exemplo de “Temporada”, estrelado pela também mineira Grace Passô, sobre a vida de agentes comunitários de combate à dengue em Contagem; e “O Dia que te Conheci”, em que boa parte da ação se passa em Betim.

          Formado em História, pela PUC Minas, André Novais despontou em edições passadas da própria Mostra de Tiradentes, com o inovador “Fantasmas” (2010), curta de 11 minutos filmados em um único take. Pouco mais de uma década depois, é significativo que a mais recente edição do evento tenha inaugurado sua programação de 145 filmes de 20 estados com duas de suas obras inéditas: o curta “Roubar um Plano”, codirigido com Lincoln Péricles; e o média “Quando Aqui”. Finalizadas em janeiro, os filmes fazem a crônica da vida cotidiana das periferias, sem grandes sobressaltos, e têm a participação dos familiares, dentre eles, o pai, Norberto Novais Oliveira, e o irmão, Renato Novaes – o único membro do clã a assinar a grafia do sobrenome com E. “Meu primeiro longa, ‘Ela Volta na Quinta’ (2014) também foi o primeiro a ter meus pais e meu irmão como atores – não é nada novo, o realismo italiano já fazia isso.

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             A partir daí, eles começaram a fazer filmes de outros diretores. Essa relação familiar com o cinema é muito forte, impregnou a gente de um jeito muito bonito”, conta o cineasta. Emociona a trajetória da matriarca, Maria José Novais, que se tornou atriz aos 60 anos: atuou em 15 filmes, e ganhou o troféu Candango de Melhor Atriz, em 2015, no Festival de Brasília, pela participação em “Quintal”, dirigido por André. Ela faleceu em 2018 e, postumamente, protagonizou o curta “Nossa mãe era atriz” (2023).

          Bárbara é outra velha conhecida da Mostra de Tiradentes. “Contagem” também estreou no evento e sua repercussão foi decisiva para a então advogada, funcionária concursada do Ministério Público de Minas Gerais, decidir deixar o emprego e investir totalmente na carreira de atriz. Pouco depois, veio o primeiro convite de Kléber Mendonça, para interpretar Clara, filha da personagem de Sônia Braga em “Aquarius”; seguido pelo papel de Teresa, de maior expressividade, em “Bacurau”, codirigido por Juliano Dornelles. “Atuar nestes filmes, em ‘Bacurau’, principalmente, foi um ponto de virada da minha carreira, quando as pessoas realmente passaram a me projetar como atriz. Senti muita sintonia desde muito cedo com o Kleber. Ele é um cara que consegue trazer paixão para o set, gerar desejo e harmonia na equipe, o que se reflete muito no resultado dos filmes”, diz Bárbara. Aos olhos do grande público, a mineira também atuou em “Quanto Mais Vida, Melhor” (2021-22), novela das sete da Globo, como a ex-modelo Rose, uma das coprotagonistas. “Foi difícil deixar de ser anônima. Gosto do set, mas não da fama que ele proporciona”, confessa.

          Para o futuro breve, André Novais planeja seu novo longa, “Se Fosse Vivo, Eu Vivia”, cuja temática é o luto. O cineasta não dá spoilers, apenas que será algo “não convencional” – o que já é de costume em sua assinatura. Bárbara curte o filho recém-nascido, Karim, e sonha em se aventurar como diretora. “Quero falar sobre mulheres, especialmente mulheres negras. O que mais me instiga é a potencialidade das histórias que não foram contadas, de temas e personagens que não soaram tão interessantes até o momento”, avisa.

 

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Caio Blat é Riobaldo na versão cinematográfica de Grande Sertão: Veredas

“O SERTÃO DENTRO DA GENTE”

           O “Grande Sertão: Veredas”, obra-prima de Guimarães Rosa, ganhou uma versão cinematográfica, pelo olhar da diretora e atriz paulistana Bia Lessa. Batizado como “O Diabo na Rua no Meio do Redemoinho”, o filme protagonizado por Caio Blat (Riobaldo) e Luiza Lemmertz (Diadorim) estreou em alto estilo na Mostra de Cinema de Tiradentes, apresentando uma releitura à moda Lars von Trier (leia-se: “Dogville”) da peça de teatro, também dirigida por Bia. A obra completa a tríade da artista, que ainda assinou a primeira exposição temporária do Museu da Língua Portuguesa, em 2006, em celebração ao então aniversário de 50 anos do livro.

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